motivação & cursos online

eu estou cursando uma pós em metodologias ativas. já tenho experiência prática no assunto, desenvolvo projetos de aprendizagem ativa na muda e na editora. então, pensei: talvez seja a hora de me aprofundar mais no tema e conhecer como instituições de ensino lidam com o assunto. e tem sido uma experiência… interessante.

quero, ainda, em outra oportunidade, explorar alguns aspectos do curso: seu currículo e como as disciplinas tem transformado a percepção que tenho sobre mim e sobre o mercado. neste texto, porém, quero focar em um trecho da disciplina de gestão da comunicação em espaços virtuais e não virtuais de aprendizagem.

o trecho é o seguinte:

O abandono do curso na EaD é atribuído, em grande parte, à relação psicologicamente distante de professores e colegas, ou seja, à falta de relações afetivas. É bastante comum também a associação desta observação à falta de dinamismo quando em encontros presenciais.

Percebe-se que a familiaridade e a união entre aluno-professor-colegas são fundamentais para que a força e determinação sejam mantidos no sentido de bem utilizar os ambientes virtuais e terminar com sucesso o curso no sistema de EaD.

fiquei chateada ao ler, ontem, esse trecho. em primeiro lugar, não há fonte. o abandono é atribuído a estes motivos por quem? quais pesquisas indicam que a familiaridade e a união aluno-professor-colega são fundamentais para a manutenção da determinação?

então, ao meu ver, o pior: qual é a relação entre a a determinação (que, supostamente, aumentaria conforme fossem desenvolvidas relações afetivas) e terminar com sucesso o curso?

essa passagem me deixa especialmente triste porque reforça, a partir do senso comum, que a motivação é central para o bom aproveitamento de um curso e sua conclusão com sucesso.

no entanto, o que mais tenho percebido na minha jornada como professora de organização, é que faltam condições materiais para o bom desenvolvimento discente em cursos EaD. estas condições materiais variam: muitas pessoas se comprometem com o curso de maneira equivocada. não tem, de fato, tempo hábil para realizar as tarefas – e acharam que a motivação seria o suficiente para abdicar de noites de sono ou finais de semana de lazer para estudar.

este problema não é de motivação, mas de organização.

não porque a organização seja capaz de criar tempo, abrir espaço a força na sua agenda. mas porque ela nos ajuda a perceber o que pode ser feito ou não. ela nos dá clareza para nossas escolhas. ela nos ajuda a executar as tarefas conforme nossas possibilidades e nos emancipa da motivação.

o problema é material, e não afetivo. a relação aluno-professor não resolve a sobrecarga do trabalho, dinâmicas familiares que exigem cuidado e atenção, o peso das atividades domésticas e a nossa dificuldade de lidar com tudo isso. em parte, porque falta organização – em parte, porque preferimos acreditar na narrativa de que nos falta motivação.

o que me incomoda sobre esta narrativa é sua natureza paralisante, culpabilizadora. suas soluções são sempre simplórias (visualizações, afirmações, afeto???) e não acessam a raíz do problema. pelo que eu vejo, as pessoas estão motivadas: mas não tem conhecimento e ferramentas para seguir executando as tarefas propostas quando a motivação não é mais combustível suficiente. até que ponto a força de vontade é capaz de nos manter com a qualidade de vida prejudicada para atingir determinado objetivo? não ´é sustentável viver assim. quando a vida aperta, não basta determinação.


disclaimer: as condições materiais que dificultam a realização dos cursos não surgem da falta de organização dos sujeitos, mas de um sistema de produção injusto e desleal. a organização nos ajuda no campo individual a perceber os limites impostos por esse sistema – justamente para não cairmos no conto de que podemos tudo-e-qualquer-coisa e de que somos pobres porque desorganizados-desmotivados-e-indisciplinados. a organização nos ajuda a entender o que cabe a nós ou não, o que pode ser escolhido ou não, para, então, agir conforme a nossa realidade e as nossas prioridades.


outros textos sobre o assunto:

a relação entre organização e motivação

porque você acredita que é desmotivada

não há autonomia na culpa

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